AND Hap: "Habitada" [Inhabited]
Fri, 29 Nov
|AND Lab Space
Scenic-Musical Spectacle | Juliana Notari
General Info
29 Nov 2024, 20:00 – 22:00 WET
AND Lab Space, Av Infante Dom Henrique 334 Floor 3 Rooms 8-10 [Metro Cabo Ruivo - 5 min. walk]
Details
Collaborative Practices Programme | 'AND Hap' Exhibition
"Habitada" [Inhabited]
Performance by Juliana Notari
AND Lab Space, Lisbon
The AND Hap exhibitions constitute temporary meeting areas that periodically open the AND Lab Space to the outside, inviting the public as accomplices and participants in unique situations of sharing what is happening here in terms of creation and research. AND Hap are activated several times a year, hosting, in the form of a happening, different types of events, ranging from open rehearsals and process displays of the residencies hosted in the Space to proposals such as interventions and performances, lectures and conferences, gatherings and parties etc. In addition, we also activate the AND Hap interface to periodically share our emerging artifacts and to mark the beginnings and endings of each season of our programming.
Recommended age: adult audience.
Participation is free and there is no registration form. Just show up :)
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[original content in Portuguese by the author]
O corpo nunca é apenas um corpo. Ele carrega consigo memórias, personalidades, desejos, sentimentos e uma complexidade única de funcionamento. Partindo do desconforto e do peso de ser socialmente definida como mulher, a marionetista Juliana Notari mergulha em um processo de investigação profundo para revelar todas as outras entidades que a habitam e desejam coexistir e se expressar. Elas podem engolir o mundo inteiro: a terra, a água, as plantas, as lágrimas, os suspiros, as pedras... Uma coisa é certa, ela não morre de fome, ela vive dentro de si.
Este é um espetáculo cênico-musical que desdobra o corpo sensível da marionetista e revela seus duplos.
Um corpo despojado, multiplicado e arrancado. Quem me define? O que me define? Essas são as grandes questões da marionetista Juliana Notari neste processo de criação. Ela revela alguns de seus duplos, as outras Julianas que a habitam, a sustentam e a compõem. A artista sentiu o desejo de se dividir em dois e assim multiplicar as infinitas possibilidades de percepção do ser, quando na vida cotidiana somos encaixados e direcionados. Ela trabalha seus olhos de carne para moldar os olhos do objeto-marionete. Desmembra o processo para transgredi-lo. Somos a conjugação de vários elementos que, por exemplo, nos permitem nos deslocar no mundo.
Nossas interações com as coisas passam por inúmeros gestos minúsculos que compõem uma ação. O gesto primordial é o olhar. Sutil, tênue, íntimo. Ele precede a aceleração, a adrenalina, a convicção. O olhar precede o desejo. Compreender o olhar essencial é o que ela se dedica, para que suas marionetes possam ter olhos e alma. Complexo, não depende apenas da visão, mas da compreensão das partes e da existência. Este é o processo mais evasivo na animação. Ela, a marionetista, se entende, compreende suas partes, sua existência, e a partir daí, adiciona um novo corpo ao seu, seja ele extensor, que respire o ar poético e anule a pessoa por momentos.
Habitada, é a construção além do corpo cotidiano. Casa, mundo, universo. Árvore, alma, matéria extensível.
A ideia foi desencadeada pelo estranhamento gerado em ser marionetista, mulher, artista e criadora. Concretizando um mundo tão sensível quanto concreto: as ideias. Construindo e manipulando o outro, e dando vida ao desconhecido, à matéria inerte.
Processo de construção e revelação dos duplos
O processo criativo deste projeto teve início há 4 anos, quando Juliana Notari desmembrou e emancipou alguns de seus conceitos sobre a marionete. Nesse período, ela também emergia de uma imersão na poética dos gestos dos idosos, o que a fez refletir sobre os movimentos e a comunicação do corpo cotidiano, percebido como uma espécie de território fixo: o corpo como casa, como pequeno mundo, como pequeno universo. Ao explorar essa dualidade, Juliana se viu diante de mais de 300 duplos, 300 Julianas tangíveis que a habitavam. Eu, velha, eu árvore, eu criança, eu animal, eu imagem, eu vácuo, eu andrógina - todos faziam parte do trabalho de síntese dramatúrgica para a construção dos duplos que figuram na obra, assim como os desdobramentos da Habitada. Para dar forma a esses personagens, Juliana utilizou uma variedade de materiais, desde o efêmero do sal até o sólido da terra misturada com ervas secas. Sangue que goteja sobre pedaços de algodão, grandes pedaços de suas roupas antigas e mini-objetos de sua infância, tudo isso se fundiu ao processo de criação, conferindo uma textura única às marionetes.
A música como fundamento da criação
Em 'Habitada', a música não é apenas um acompanhamento, mas uma coautora da obra. Durante um processo de criação intenso, Juliana e o compositor mergulharam na sala de ensaio, construindo e desconstruindo cenas de forma meticulosa. Nessa colaboração, Juliana convidou o compositor a explorar seus próprios duplos, buscando uma fusão entre gesto e som. Através de uma profunda interação entre escuta e ação, os dois artistas conseguiram entrelaçar suas linguagens de forma intrínseca. O objetivo era criar uma sinestesia, onde música e movimento se complementam desde a concepção até a execução, resultando em uma obra que estimula todos os sentidos.
Citações sobre o espetáculo
"Antropofagia reversa. Não é você como artista que engole o que está em volta para se tornar uma nova outra, algo entre fronteiras. Não, você faz o público engolir as diversas você para, por goela abaixo das emoções, sensações e de qualquer forma de captação humanamente possível, transformar os outros pela multidimensionalidade da sua arte. As fronteiras não são ultrapassadas porque você engole algo novo e "estranho" ao seu corpo. As fronteiras não fazem o menor sentindo pra você, por isso você não precisa engolir nada. Pelo contrário, você tem tanto e tantas, que você leva o público a te antropofagizar. Eles serão outros. Você será você mesma. Uma arte que entra pelos poros goela abaixo, com a naturalidade de um público que não percebe o buraco negro expelindo um amontoado de galáxias que eles acabaram de presenciar. Você é uma antropofagia reversa. Pode ter um olho e meio ou um olho só, pouco importa. O público nem imagina que vai te engolir... mas vai..."
Escrito por Ronan Gil, músico, percussionista, pesquisador e professor franco- brasileiro.
Somos seres múltiplos, habitados por várias consciências. Trazê-las a luz da consciência, parí-las para a racionalidade, requer coragem e garra. Parto de amor, dor, valentia. O inconsciente buscando a consciência. Os elementais são parceiros nesta jornada. A água que limpa, lava, liberta. Regar e nutrir requer parceria e conexão com a mãe natureza. Ground, pés no chão, focados na jornada do auto mergulho de nossos nascimentos/renascimentos. O engatinhar da criança curiosa, lúdica, livre. O novo recém parido quer comer o mundo. A velha, o velho sábio, segue firme com o olhar atento em sua jornada do arquétipo da sabedoria, da busca da luz e sombra interna. Buscadora, desbravadora de caminhos, de dentro pra fora e de fora pra dentro. Caminhante, pés firmes, Avante! Das entranhas o Diabinho quer brotar e se fazer prazer. Sem freios, sem amarras, regras ou convenções. Sacana, voraz, prazeiroso; Eros livre e libertário. A gargalhada inicialmente nervosa e contida, explode diante da alma lavada; crua e desnuda.
Escrito por Lilis Alves, psicóloga brasileira.
Juliana Notari
Juliana Notari trabalha há mais de duas décadas com um compromisso intenso na arte das marionetes, explorando novas formas de existência por meio de experimentações, criação de espetáculos, performances, instalações, filmes, intervenções, festivais, encontros e desenvolvimento de uma pedagogia própria, a Pedagogia da Marionete Livre, título do livro publicado em 2022. Desde o ano 2000, ela se dedica à pesquisa da marionete contemporânea e à etnografia da matéria e do movimento. Em 2005, concluiu sua graduação em Artes do Espetáculo pela Universidade Estadual Paulista (UNESP). Em 2009, foi bolsista no Institut International de la Marionnette em Charleville-Mézières, na França, onde estudou a relação entre marionete, público e marionetista. Residiu por sete anos na França, onde iniciou um mestrado em Artes do Espetáculo na Universidade de Estrasburgo, o qual abandonou em 2010 para realizar o projeto "Vieilles Boîtes", uma pesquisa artística sobre a velhice, vivendo seis meses em uma casa de repouso na região de Rhône-Alpes e produzindo cinco peças. Como artista, marionetista, diretora, dramaturga e educadora teatral, ela criou dezenas de obras, festivais, blocos, cabarés, oficinas e cursos, realizando turnês no Brasil, Bulgária, México, Bolívia, Argentina, Colômbia, Espanha, Letônia, França, Portugal, República Tcheca, Itália, Suíça, Coreia do Sul, entre outros países. Em 2010, recebeu o prêmio de melhor experimentação nas artes da marionete no Festival de Praga. De 2014 a 2020, foi gestora do Condomínio Cultural em São Paulo, onde coordenou um atelier dedicado ao movimento da matéria e à Marionete Livre. É fundadora da Sociedade Insólita para Marionete Contemporânea, juntamente com seus colegas Cleber Laguna e Márcia Fernandes da Cia Mevitevendo. Em 2021-2022, realizou o projeto "20 anos de Marioneta Libre - Celebração e Manifesto", apoiado pelo edital Rumos Itaú Cultural. O projeto incluiu a criação do curta-metragem "Coágulo" e a publicação do livro "Pedagogia da Marioneta Libre". Em 2019, criou e realizou em Barcelona o "MICROCINÈTIQUES · 1a Trobada de marionetes, miniatures i lambe- lambes". Em 2022, criou e realizou com a La Pupila producciones o ciclo de formação "Lambescola" na Catalunha, sobre teatro em miniatura, com artistas latino-americanos. Em 2022, foi roteirista e consultora de mecanismos para a exposição "Cidadela" de Maria Zuquim, com uma temporada inaugural no Sesc Pompeia. Em 2023, realizou uma exposição de repertório no Festival Anima IF, na ilha da Sardenha, na Itália. Atualmente, colabora com o Grupo Folias, criando marionetes e auxiliando na animação e movimentos para a nova peça "Coisas estranhas que o mar traz".
Ivan Chiarelli
Compositor, produtor e intérprete brasileiro residente em Berlim. Seu trabalho tem raízes na paisagem sonora e na narrativa, com particular preocupação pelos aspectos políticos e sociais contemporâneos. É membro da Delian Academy for New Music, e entre seus meus tutores estão Gregory Mertl, Alexandre Lunsqui e Flo Menezes. Um compositor premiado no Festival Música Nova (Brasil, 2008), seus trabalhos foram realizados nas Américas, Europa e Ásia, por artistas e grupos como o Alter Ego Ensemble, Bera Romairone, Leonardo Labrada, Grupo PIAP, Orquestra Sinfônica de Santos e Augusto Moralez. Compôs para performances, apresentações em concertos, instalações, teatro e mídia audiovisual, tendo também colaborado com as artistas Juliana Notari, Carol Neumann e Flavia Mielnik, entre outras. É co-fundador da sonic art collective invisibili(cidades), e frequentemente colabora com a NME (Nova Música Eletroacústica). Como intérprete - baixo elétrico, computer processing e uma variedade de instrumentos de piano a percussão - tocou com Mauricio Takara (Hurtmold, M. Takara), Gregor Siedl e Lan Cao (Asteroid Paralelo), Richard Ribeiro (Porto) , Afro Hooligans, Beto Mejía (Móveis Coloniais de Acaju), Tiago de Mello e Julia Teles entre outros.
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Technical Details
Creation, design and manipulation of puppets: Juliana Notari Costumes: Kelly Cristina Santos
Original composition: Ivan Chiarelli Lighting design: Cris Souto
Duration: 45 minutes